terça-feira, 24 de abril de 2012

PsicoArtigos


O Mito da caverna

Imaginemos um muro bem alto separando o mundo externo e uma caverna. Na caverna existe uma fresta por onde passa um feixe de luz exterior. No interior da caverna permanecem seres humanos, que nasceram e cresceram ali.

Ficam de costas para a entrada, acorrentados, sem poder locomover-se, forçados a olhar somente a parede do fundo da caverna, onde são projetadas sombras de outros homens que, além do muro, mantêm acesa uma fogueira. Pelas paredes da caverna também ecoam os sons que vêm de fora, de modo que os prisioneiros, associando-os, com certa razão, às sombras, pensam ser eles as falas das mesmas. Desse modo, os prisioneiros julgam que essas sombras sejam a realidade.

Imagine que um dos prisioneiros consiga se libertar e, aos poucos, vá se movendo e avance na direção do muro e o escale, enfrentando com dificuldade os obstáculos que encontre e que saia da caverna, descobrindo não apenas que as sombras eram feitas por homens como eles, e mais além todo o mundo e a natureza.

Caso ele decida voltar à caverna para revelar aos seus antigos companheiros a situação extremamente enganosa em que se encontram, correrá, segundo Platão, sérios riscos - desde o simples: ser ignorado, até: ser agarrado e morto por eles, que o tomarão por louco e inventor de mentiras.



Nesta alegoria Platão chama nossa atenção para vários aspectos da condição humana. Porém, gostaria de ressaltar apenas um: como ainda nos dias de hoje os homens são prisioneiros de si, acorrentados em suas falsas crenças, preconceitos, passividades, precipitações e ilusões que limitam seu crescimento e desenvolvimento.

Não precisamos nos identificar com a figura dos prisioneiros, podemos nos libertar e por mais difícil que possa parecer, olhar uma nova realidade, ainda que cheia de dúvidas e inseguranças, mas com a certeza de que se trata da vida real!

Reflita e traga para sua realidade!

Analise se você é um prisioneiro!

Grande abraço
Roberta Marin Passos
Psicóloga do Lien Clínica e Assessoria

terça-feira, 17 de abril de 2012

Cinema e Linguagem

Filme: "O Discurso do Rei"


Sinopse:
“George VI (Colin Firth), conhecido como Bertie, assume, a contragosto, o trono de rei da Inglaterra quando seu irmão, Edward (Guy Pearce), abdica do posto em 1936. Despreparado, o novo rei pede o auxílio de um especialista em discursos, Lionel Logue (Geoffrey Rush), para superar seu nervosismo e gagueira. Com o tempo, tornam-se amigos.”



Comentários:
Este filme trouxe à tona uma discussão sobre a gagueira da perspectiva do falante, possibilitando aos que o assistem partilhar da angústia e da insegurança na busca insistente por um discurso mais fluente. No filme, há momentos em que a desistência e a persistência aos tratamentos retratam o que comumente vemos no dia-a-dia de pessoas que sofrem por não conseguirem falar em público, ou mesmo por ficarem expostas a constrangimentos e chacotas daqueles que desconhecem o que de fato ocorre com o sujeito que gagueja. Normalmente, a imagem de quem gagueja é associada àquele indivíduo inseguro, com estereótipos cruéis e avassaladores para os que se identificam com eles. Aqui, diferentemente, somos convidados a assistir não a um sujeito engraçado e perdedor, mas sim a uma pessoa que quer se superar, que precisa resgatar em si o que há de melhor para construir um discurso que, mesmo com falhas, seja digno de ‘um rei’.
       
Elisângela Bassi, Fonoaudióloga e Mestre em Lingüística.
Parceira do Lien Clínica e Assessoria 

terça-feira, 10 de abril de 2012

Cinema e Psicanálise

HABEMUS PAPAM
2011 (Itália, França)
Direção: Nanni Moretti



A dica é um filme em cartaz deste renomado diretor italiano que já adentrou a psicanálise com o comovente “O Quarto do Filho”, onde relata a experiência de luto de um analista diante da morte do filho.
Em “Habemus Papam” entra em cena a psicanálise e a religião, já que o protagonista, um cardeal que entra em crise quando é eleito papa, não consegue assumir o seu papel na igreja. Com a crise de pânico a igreja convoca um psicanalista renomado e ateu para cuidar da situação.
A recusa do papa diante dos compromissos de fé expõe sua condição humana. O filme pincela situações terapêuticas, reflexões do religioso, suas frustrações diante de escolhas não realizadas, deixando evidente no protagonista a certeza de não assumir tal responsabilidade.
A foto a seguir se refere a uma cena inicial, na tentativa fracassada do analista de criar um setting terapêutico, quando o futuro papa é entrevistado sem nenhuma privacidade.


É um filme polêmico, comovente, bem humorado e corajoso, que expõe não só a igreja, mas também a psicanálise.

Vanessa M. da Ponte
Psicóloga do Lien Clínica e Assessoria

domingo, 8 de abril de 2012

PsicoArtigos

Síndrome de Hardy Har Har

Lembram-se do Hardy Har Har? A hiena que era puxa saco do Lippy, o leão. Pois então, tem muita gente que sofre de “Síndrome de Hardy Har Har”. O personagem, ao contrário de todo o resto de sua raça, que vive rindo de tudo, é infeliz, uma figura negativa em todos os sentidos. Hardy ficou famoso pela frase: “Oh dia! Oh azar!”.
Já parou para pensar o quanto da porção Hardy você tem?
Quantas vezes durante um dia lamentamos a vida, as situações, nosso trabalho, nossa família, nossas relações afetivas.  Blasfemamos o mundo e as pessoas, nos colocamos como vítimas, mas não olhamos para nós, buscando nossa responsabilidade em tudo isso.
E por quê?
Talvez seja mais fácil encontrar a falha fora, no outro. Acreditar que é o mundo que conspira contra você e não o contrário. É cômodo, pois assim não precisa se movimentar nem buscar alternativas e saídas, só lamentar.
É se colocar como passivo diante da vida, acreditar que é ela quem dita os caminhos e não você que escolhe. Os Hardy Har Hars são sempre coadjuvantes ou figurantes. Alguns têm até talento, mas se escondem, com a desculpa de descrição. São aqueles que sempre dizem amém, derrotados por si mesmos.
A psicanalista Cláudia Bernhardt de Souza Pacheco, em seu livro De Olho na Saúde, alerta:
“Aquele que usa um pouco da sua consciência, logo se destaca entre os demais e na vida as coisas começam a dar certo”.
Reflita e analise sua porção Hardy!

Boa semana!!!

Roberta Marin
Psicóloga

terça-feira, 3 de abril de 2012

Reflexões Psicanalíticas

Recomendo este texto, especialmente para pais e educadores. O tema "filhos" é sempre instigante.
Neste artigo, a excelente jornalista Eliane Brum nos alerta sobre a tentativa de evitar sofrimentos e frustrações nos nossos filhos/alunos, etc.
O problema que Eliane discute, acredito, tenha a ver com a dificuldade da geração anterior (a nossa) de lidar com os nossos sofrimentos, recalques e proibições, tentando assim, inconscientemente, evitar esta dor na geração seguinte. Mas ela nos adverte, isto não somente é impossível, como prejudicial. Convido, então a leitura e reflexão.

Liliana Emparan
Psicanalista e Psicopedagoga do LIEN Clínica e Assessoria.


  Meu filho, você não merece nada
A crença de que a felicidade é um direito tem tornado despreparada a geração mais preparada
Eliane Brum
Ao conviver com os bem mais jovens, com aqueles que se tornaram adultos há pouco e com aqueles que estão tateando para virar gente grande, percebo que estamos diante da geração mais preparada – e, ao mesmo tempo, da mais despreparada. Preparada do ponto de vista das habilidades, despreparada porque não sabe lidar com frustrações. Preparada porque é capaz de usar as ferramentas da tecnologia, despreparada porque despreza o esforço. Preparada porque conhece o mundo em viagens protegidas, despreparada porque desconhece a fragilidade da matéria da vida. E por tudo isso sofre, sofre muito, porque foi ensinada a acreditar que nasceu com o patrimônio da felicidade. E não foi ensinada a criar a partir da dor.

Há uma geração de classe média que estudou em bons colégios, é fluente em outras línguas, viajou para o exterior e teve acesso à cultura e à tecnologia. Uma geração que teve muito mais do que seus pais. Ao mesmo tempo, cresceu com a ilusão de que a vida é fácil. Ou que já nascem prontos – bastaria apenas que o mundo reconhecesse a sua genialidade.

Tenho me deparado com jovens que esperam ter no mercado de trabalho uma continuação de suas casas – onde o chefe seria um pai ou uma mãe complacente, que tudo concede. Foram ensinados a pensar que merecem, seja lá o que for que queiram. E quando isso não acontece – porque obviamente não acontece – sentem-se traídos, revoltam-se com a “injustiça” e boa parte se emburra e desiste.

Como esses estreantes na vida adulta foram crianças e adolescentes que ganharam tudo, sem ter de lutar por quase nada de relevante, desconhecem que a vida é construção – e para conquistar um espaço no mundo é preciso ralar muito. Com ética e honestidade – e não a cotoveladas ou aos gritos. Como seus pais não conseguiram dizer, é o mundo que anuncia a eles uma nova não lá muito animadora: viver é para os insistentes.

Por que boa parte dessa nova geração é assim? Penso que este é um questionamento importante para quem está educando uma criança ou um adolescente hoje. Nossa época tem sido marcada pela ilusão de que a felicidade é uma espécie de direito. E tenho testemunhado a angústia de muitos pais para garantir que os filhos sejam “felizes”. Pais que fazem malabarismos para dar tudo aos filhos e protegê-los de todos os perrengues – sem esperar nenhuma responsabilização nem reciprocidade.

É como se os filhos nascessem e imediatamente os pais já se tornassem devedores. Para estes, frustrar os filhos é sinônimo de fracasso pessoal. Mas é possível uma vida sem frustrações? Não é importante que os filhos compreendam como parte do processo educativo duas premissas básicas do viver, a frustração e o esforço? Ou a falta e a busca, duas faces de um mesmo movimento? Existe alguém que viva sem se confrontar dia após dia com os limites tanto de sua condição humana como de suas capacidades individuais?

Nossa classe média parece desprezar o esforço. Prefere a genialidade. O valor está no dom, naquilo que já nasce pronto. Dizer que “fulano é esforçado” é quase uma ofensa. Ter de dar duro para conquistar algo parece já vir assinalado com o carimbo de perdedor. Bacana é o cara que não estudou, passou a noite na balada e foi aprovado no vestibular de Medicina. Este atesta a excelência dos genes de seus pais. Esforçar-se é, no máximo, coisa para os filhos da classe C, que ainda precisam assegurar seu lugar no país.

Da mesma forma que supostamente seria possível construir um lugar sem esforço, existe a crença não menos fantasiosa de que é possível viver sem sofrer. De que as dores inerentes a toda vida são uma anomalia e, como percebo em muitos jovens, uma espécie de traição ao futuro que deveria estar garantido. Pais e filhos têm pagado caro pela crença de que a felicidade é um direito. E a frustração um fracasso. Talvez aí esteja uma pista para compreender a geração do “eu mereço”.

Basta andar por esse mundo para testemunhar o rosto de espanto e de mágoa de jovens ao descobrir que a vida não é como os pais tinham lhes prometido. Expressão que logo muda para o emburramento. E o pior é que sofrem terrivelmente. Porque possuem muitas habilidades e ferramentas, mas não têm o menor preparo para lidar com a dor e as decepções. Nem imaginam que viver é também ter de aceitar limitações – e que ninguém, por mais brilhante que seja, consegue tudo o que quer.

A questão, como poderia formular o filósofo Garrincha, é: “Estes pais e estes filhos combinaram com a vida que seria fácil”? É no passar dos dias que a conta não fecha e o projeto construído sobre fumaça desaparece deixando nenhum chão. Ninguém descobre que viver é complicado quando cresce ou deveria crescer – este momento é apenas quando a condição humana, frágil e falha, começa a se explicitar no confronto com os muros da realidade. Desde sempre sofremos. E mais vamos sofrer se não temos espaço nem mesmo para falar da tristeza e da confusão.

Me parece que é isso que tem acontecido em muitas famílias por aí: se a felicidade é um imperativo, o item principal do pacote completo que os pais supostamente teriam de garantir aos filhos para serem considerados bem sucedidos, como falar de dor, de medo e da sensação de se sentir desencaixado? Não há espaço para nada que seja da vida, que pertença aos espasmos de crescer duvidando de seu lugar no mundo, porque isso seria um reconhecimento da falência do projeto familiar construído sobre a ilusão da felicidade e da completude.

Quando o que não pode ser dito vira sintoma – já que ninguém está disposto a escutar, porque escutar significaria rever escolhas e reconhecer equívocos – o mais fácil é calar. E não por acaso se cala com medicamentos e cada vez mais cedo o desconforto de crianças que não se comportam segundo o manual. Assim, a família pode tocar o cotidiano sem que ninguém precise olhar de verdade para ninguém dentro de casa.

Se os filhos têm o direito de ser felizes simplesmente porque existem – e aos pais caberia garantir esse direito – que tipo de relação pais e filhos podem ter? Como seria possível estabelecer um vínculo genuíno se o sofrimento, o medo e as dúvidas estão previamente fora dele? Se a relação está construída sobre uma ilusão, só é possível fingir.

Aos filhos cabe fingir felicidade – e, como não conseguem, passam a exigir cada vez mais de tudo, especialmente coisas materiais, já que estas são as mais fáceis de alcançar – e aos pais cabe fingir ter a possibilidade de garantir a felicidade, o que sabem intimamente que é uma mentira porque a sentem na própria pele dia após dia. É pelos objetos de consumo que a novela familiar tem se desenrolado, onde os pais fazem de conta que dão o que ninguém pode dar, e os filhos simulam receber o que só eles podem buscar. E por isso logo é preciso criar uma nova demanda para manter o jogo funcionando.

O resultado disso é pais e filhos angustiados, que vão conviver uma vida inteira, mas se desconhecem. E, portanto, estão perdendo uma grande chance. Todos sofrem muito nesse teatro de desencontros anunciados. E mais sofrem porque precisam fingir que existe uma vida em que se pode tudo. E acreditar que se pode tudo é o atalho mais rápido para alcançar não a frustração que move, mas aquela que paralisa.

Quando converso com esses jovens no parapeito da vida adulta, com suas imensas possibilidades e riscos tão grandiosos quanto, percebo que precisam muito de realidade. Com tudo o que a realidade é. Sim, assumir a narrativa da própria vida é para quem tem coragem. Não é complicado porque você vai ter competidores com habilidades iguais ou superiores a sua, mas porque se tornar aquilo que se é, buscar a própria voz, é escolher um percurso pontilhado de desvios e sem nenhuma certeza de chegada. É viver com dúvidas e ter de responder pelas próprias escolhas. Mas é nesse movimento que a gente vira gente grande.

Seria muito bacana que os pais de hoje entendessem que tão importante quanto uma boa escola ou um curso de línguas ou um Ipad é dizer de vez em quando: “Te vira, meu filho. Você sempre poderá contar comigo, mas essa briga é tua”. Assim como sentar para jantar e falar da vida como ela é: “Olha, meu dia foi difícil” ou “Estou com dúvidas, estou com medo, estou confuso” ou “Não sei o que fazer, mas estou tentando descobrir”. Porque fingir que está tudo bem e que tudo pode significa dizer ao seu filho que você não confia nele nem o respeita, já que o trata como um imbecil, incapaz de compreender a matéria da existência. É tão ruim quanto ligar a TV em volume alto o suficiente para que nada que ameace o frágil equilíbrio doméstico possa ser dito.

Agora, se os pais mentiram que a felicidade é um direito e seu filho merece tudo simplesmente por existir, paciência. De nada vai adiantar choramingar ou emburrar ao descobrir que vai ter de conquistar seu espaço no mundo sem nenhuma garantia. O melhor a fazer é ter a coragem de escolher. Seja a escolha de lutar pelo seu desejo – ou para descobri-lo –, seja a de abrir mão dele. E não culpar ninguém porque eventualmente não deu certo, porque com certeza vai dar errado muitas vezes. Ou transferir para o outro a responsabilidade pela sua desistência.

Crescer é compreender que o fato de a vida ser falta não a torna menor. Sim, a vida é insuficiente. Mas é o que temos. E é melhor não perder tempo se sentindo injustiçado porque um dia ela acaba.

(Eliane Brum escreve às segundas-feiras.)
Jornalista, escritora e documentarista. Ganhou mais de 40 prêmios nacionais e internacionais de reportagem. É autora de Coluna Prestes – O Avesso da Lenda (Artes e Ofícios), A Vida Que Ninguém Vê (Arquipélago Editorial, Prêmio Jabuti 2007) e O Olho da Rua (Globo).
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI247981-15230,00-MEU+FILHO+VOCE+NAO+MERECE+NADA.html