segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Cinema e Psicanálise


BRANCA DE NEVE

(Blancanieves)
Espanha, 2013
Diretor: Pablo Berger

Sinopse e comentários:

Versão espanhola do conto de fadas em preto e branco e sem diálogos. Ambientada na Sevilha de 1920 com touradas, trilha sonora e dança flamenca.
A Branca de Neve se chama Carmen e é criada pela avó materna. Seus pais eram um casal apaixonado, a mãe dançarina de flamenco e o pai um famoso toureiro. Após o nascimento de Carmen, a mãe morre no parto e coincide com um trágico acidente com o pai nas touradas. O pai rejeita a filha com a morte da amada e fica sob os cuidados de uma enfermeira interesseira, que se torna depois sua esposa. O pai fica paraplégico e prisioneiro da nova esposa deslumbrada com sua riqueza. Com a morte da avó, Carmen também fica submetida aos maus tratos da madrasta. Porém, enquanto ela se entretém com seus luxos e amante, Carmen usufrui da curta convivência com o pai. Ela o alegra e ele a ensina a tourear. Após a morte do pai premeditada pela madrasta, Carmen foge, conhece um grupo de anões toureiros e segue os caminhos do pai se tornando uma toureira famosa. Em evidência, Carmen chama a atenção da madrasta, que se enfurece ao vê-la em destaque nas capas das revistas. A madrasta busca o mesmo destaque sendo fotografada para as manchetes pela sua riqueza. O que está em jogo não é a beleza, mas a fama e o sucesso.
Carmen conquista o êxito pelo seu talento e carisma, mas com certa ingenuidade. A maldade da madrasta é evidente e a exploração de seu empresário também, pois faz Carmen assinar um contrato 'para sempre' com ele nas touradas. Ela conta com a amizade e dedicação dos anões, seus verdadeiros aliados. O final não é feliz e nem convencional, pois como não há príncipe não há beijo que desperte esta Carmen submetida a exploração de um contrato e adormecida como Branca de Neve...

A nova versão conserva alguns pontos relevantes do conto clássico com algumas considerações psicanalíticas interessantes extraídas do livro “A Psicanálise dos Contos de Fadas" de Bruno Bettelheim:

Branca de Neve quando foge penetra no caminho desesperadamente solitário de buscar-se a si mesma. Os anos com os anões que representam o período de dificuldades, de elaboração dos problemas, seu período de crescimento. A luta edípica da menina púbere não é reprimida, mas se concretiza ao redor da mãe como competidora. O pai não consegue uma posição forte e definida, não oferecendo segurança e proteção para ela. Os anões são incapazes de protegê-la e a madrasta ainda tem poder sobre ela, pois consegue lhe oferecer a maça envenenada. O conto de Fadas mostra que não podemos nos libertar do impacto dos pais e dos sentimentos que temos por eles, fugindo de casa, embora pareça o caminho mais fácil. A independência se dá na elaboração dos conflitos internos. A rainha madrasta representa a mãe que temporariamente consegue 'parar' o desenvolvimento da filha. Seu desmaio simboliza que foi esmagada pelo conflito entre os desejos sexuais e a ansiedade quanto à eles. Sãos seus conflitos adolescentes sua ruína ao que parece. A maça representa o amor e o sexo. Remete-nos a Afrodite e a Eva (fruto proibido). O sono mortal de Branca de Neve no caixão de vidro transparente é um período de gestação, seu período final de preparação para a maturidade. O branco simboliza a pureza, a inocência. A conexão com a Neve simboliza a inércia. Quando a neve cobre a terra, a vida parece estancar.
A estória da Branca de Neve ensina que alcançar a maturidade física não significa estar preparado emocionalmente e intelectualmente para a idade adulta.
São necessários tempo e crescimento para esta maturidade.


"Cantiga para não morrer" de Ferreira Gullar:

'Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.
Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.
Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.
E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento'.



Vanessa M. da Ponte
Psicóloga do Lien Clínica e Assessoria

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